Todos Iguais, Todos Diferentes: Um Estigma Migratório
A partir do século XIV, Portugal tornou-se sinónimo de fluxo migratório. Um povo que deu novos mundos ao mundo, expandiu a língua de Camões e espalhou a cultura lusitana, tornou-se sujeito passivo de um direito potestativo cosmopolita, do qual não pode prescindir.
Como pode um país de tal compacta dimensão testemunhar os seus cidadãos presentes nos mais diversos cantos do mundo? A promover Portugal para além do Atlântico e a suscitar a curiosidade daqueles que cá chegam para viver, estudar, investir e trabalhar.
A análise que se segue não é inerente a questões como: Portugal deve ou não receber mais imigrantes? Deve manter as portas abertas ou fechá-las? Ao invés, trata-se de uma análise da condição social e situação económica dos novos residentes que procuram melhores condições no tão literalmente aclamado espaço luso.

(fonte: https://www.eurodicas.com.br/residencia-permanente-em-portugal/</p> )
1. A Igualdade enquanto Princípio do Direito
Igualdade, uma palavra amplamente usada, vulgarmente banalizada e quase sempre associada a direitos inerentes ao ser humano. Mas o que é, de facto, a Igualdade?
Através de uma pesquisa rápida e abrangente na internet, motor de pesquisa disseminado nas sociedades ocidentais, é possível aferir que «A Igualdade é um Princípio que defende que todos os indivíduos devem ser tratados da mesma maneira, com os mesmos direitos e oportunidades, sem distinções de origem, género, raça, religião ou outras características».
Constitui um dos Princípios Gerais da Constituição da República Portuguesa e, nos termos do artigo 13§1.º «Todos os cidadãos têm a mesma dignidade social e são iguais perante a lei». Mais profícuo e categórico, para a nossa análise, é o que o legislador consagrou à luz do número 2 do mesmo artigo, isto é, «Ninguém pode ser privilegiado, beneficiado, prejudicado, privado de qualquer direito [...] em razão de ascendência, [...], situação económica, condição social».
1.1 Imigração e Discurso Político
Nos últimos anos, a imigração tornou-se o foco do discurso político e, segundo alguns, a fonte de problemas sociais que, infelizmente, têm marcado o quotidiano português. Concomitantemente, instrumentaliza-se e propaga-se a ideia de que os imigrantes são os responsáveis por tais infelicidades. Mas não todos, apenas alguns. Apenas aqueles cuja "situação económica, condição social" não lhes permite viver "à grande e a francesa" a saborear a especulação imobiliária no sul do Tejo.
2. "Somos todos iguais, mas alguns são mais iguais do que os outros"
Considerando a célebre citação do livro "A Revolução dos Bichos", da autoria de George Orwell, deparamo-nos com um fidedigno retrato da realidade atual, onde impera a igualdade desproporcional entre os imigrantes, bem como a criação de uma categoria privilegiada. Diminuta, mas abundante em privilégios. Por oposição à outra face: de dimensão significativa, mas diminuta em privilégios, enquanto que aqueles cuja «situação económica» permite, comprar um imóvel, sob determinadas condições, são titulares de benefícios que os demais, os demais, cuja «condição social» não lhes permite celebrar o mesmo tipo de contrato oneroso, não possuem. E são estes últimos que, na maioria das vezes, têm de enfrentar os condicionalismos sociais e processuais conhecidos e aguardar a lentidão dos processos burocráticos e garantia dos seus direitos sociais. Como se tal não bastasse, são, os mesmos, alvos do estigma migratório que impera hoje mais que nunca.
2.1 Igualdade Seletiva
O conceito de igualdade seletiva refere-se à aplicação desigual de um princípio de igualdade. Deste modo, o princípio constitucional é aplicado apenas a um grupo específico, excluindo assim os demais. Tal caso sucedeu com a exclusão das mulheres da cidadania à luz da Revolução Francesa.
De acordo com o Relatório Migrações e Asilo da Agência para a Integração, Migrações e Asilo (AIMA) de 2024, citado pelo jornal Público: «Em cada 10 imigrantes com título para residir e trabalhar em Portugal apenas um teve direito ao reagrupamento familiar. Mas para cada 10 títulos de residência com Vistos Gold, 15 familiares conseguiram regularizar-se». Ora, os números evidenciam, manifestamente, uma acentuada assimetria no direito à vida familiar, por oposição ao direito ao trabalho. Tais dados ilustram um Portugal que não trata a imigração como fenómeno humano completo, mas como recurso económico ou estatístico. Mais ainda, constata-se um modelo restritivo que favorece quem tem poder económico (visto gold) mas falha em criar condições de estabilidade e integração social para trabalhadores comuns.
Desta forma, é possível concluir que é dado um tratamento igual aos iguais e desigual aos desiguais. Assim sendo, estes sujeitos são «Todos Iguais» por serem imigrantes e, apesar da aparente igualdade, são «Todos Diferentes» em razão da situação económica e condição social.
Joel Lopes,
Analista e Colaborador do NEDMA
